segunda-feira, 31 de março de 2008

LENDA: VITÓRIA RÉGIA



A MAIS BELA DAS FLORES AQUÁTICAS


No coração da floresta amazônica vivia uma tribo de bravos guerreiros dentre eles a jovem Naiá, doce indiazinha que se apaixonara perdidamente por Jaci (a lua) que iluminava as noites.


Segundo os pajés, Jaci de vez em quanto descia a terra para buscar uma virgem e transformá-la em estrela para viver junto dela no céu. Naiá ao escutar tal história decidiu que queria ser transformada em uma estrela para viver junto do seu amor.


Naiá era bela, os bravos guerreiros sempre a cortejavam, mas nada adiantava, ela recusava todos os convites de casamento devido a sua grande paixão. Todos os dias esperava com ansiedade a lua surgir para então admirá-la . Já quase se manhãzinha Naiá saiu correndo em direção oposta ao sol para tentar alcançar Jaci, mas tudo era em vão, a lua ia embora sem lhe dar atenção.


Em uma noite Naiá adoeceu e de tanto ser ignorada pela lua começou a definhar. Mesmo assim, todas as noites fugia para admirá-la. Numa dessas vezes a indiazinha ao ver o reflexo da lua no rio, imaginou que Jaci tivesse vindo buscá-la e exultante de felicidade mergulhou nas águas profundas do igarapé e morreu afogada.


A lua com dó da bela indiazinha e vendo o seu sacrifício, resolveu transformá-la em uma linda estrela incomum, não para brilhar no céu, mas para refletir o clarão do luar nas águas dos rios da Amazônia. A esta estrela (NAIÁ) atribuí-se o nome Vitória-Régia, a linda flor aquática da Amazônia que só abre suas pétalas ao clarão do luar.

MITO: A MULHER DA MEIA-NOITE


A Mulher da Meia-Noite, também Dama de Vermelho, Dama de Branco, é um mito universal. Ocorre nas Américas e em toda Europa.


É uma aparição na forma de uma bela mulher, normalmente vestida de vermelho, mas pode ser também de branco. Alguns dizem, que é uma alma penada que não sabe que já morreu, outros afirmam que é o fantasma de uma jovem assassinada que desde então vaga sem rumo. Na verdade ela não aparece à meia-noite, e sim, desaparece nessa hora.


Linda como é, parece uma jovem normal. Gosta de se aproximar de homens solitários nas mesas de bar. Senta com ele, e logo o convida para que a leve para casa. Encantado com tamanha beleza, todos topam na hora. Eles caminham, e conversando logo chegam ao destino. Parando ao lado de um muro alto, ela então diz ao acompanhante: "É aqui que eu moro...". É nesse momento que a pessoa se dá conta que está ao lado de um cemitério, e antes que possa dizer alguma coisa, ela desaparece, e nessa hora, o sino da igreja anuncia que é meia-noite.


Outras vezes, ela surge nas estradas desertas, pedindo carona. Então pede ao motorista que a acompanhe até sua casa. E, mais uma vez a pessoa só percebe que está diante do cemitério, quando ela com sua voz suave e encantadora diz: "É aqui que eu moro, não quer entrar comigo...?". Gelado da cabeça aos pés, a única coisa que a pessoa vê, é que ela acabou de sumir diante dos seus olhos, à meia-noite em ponto.


LENDAS DO BRASIL - NORDESTE


Carro caído


O negro vinha da Aldeia Velha, servindo de carreiro. o carro tinha muito sebo com carvão nas rodas e chiava como frigideira. Aquilo não se acaba nunca.
Sua Incelência já preparou os ouvidos da gente quando está com as meleitas? Pois, tal e qual.
O carreiro era meu charapim: acudia pelo nome de João, como eu.
Deitou-se nas tábuas, enquanto os bois andavam para diante, com as archatas merejando suor que nem macaxeira encruada.
Levava um sino para a Capela de Estremoz, na vila era povo como abelha, esperando o brônzio para ser batizado logo.
João de vez em quando acordava e cutucava a boiada com a vara de ferrão:
- Eh, Guabiraba!, eh, Rompe-Ferro, eh, Manezinho!
Era lua cheia.
Sua Incelência já viu uma moeda de ouro dentro de uma bacia de flandres? Assim estava a lua lá em cima.
João encarou o céu como onça ou gato-do-mato.
Pegou nosono e o carro andando...
Mas a boiada começou a fracatear, e ele quando acordava, zás - tome ferroada!
Os bois tomaram coragem e força. Ele cantou uma toada da terra dos negros, triste, triste, como quem está de despedindo.
Os bois parece que gostaram e seguraram o passo.
Então ele pegou de novo no sono.
Quando acordou, os bois estavam de novo parados.
- Diabo!, e tornou a emendá-los com o ferrão!
A coruja rasgou mortalha, João não adivinhou, mas a coruja estava dizendo que naquela hora e carregando um sino pra casa de Nosso Senhor não se devia falar no maldito.
Gritou outra vez:
- Diabo!
O canhoto então gritou do inferno:
- Quem é que está me chamando?
João a mdo que ouviu e ficou arrepiado. Assobiou para enganar o medo; tornou a cantar a toada, numa voz de fazer cortar o coração, como quem está se despedindo.
Pegou ainda no sono uma vez. A luz da lua escorrendo do céu era que em dormideira!
Quando acordou - aquilo só mandando! - a boiada de pé.
- Diabo!
O maldito rounou-lhe ao ouvido:
- Cá está ele!
E arrastou o carro pra dentro da lagoa com o pobre negro, os bois e tudo.
Sua Incelência já passou pôs aqui depois da primeira cantada do galo no tempo da Quaresma? Quando passar, faça reparo: - canta o carreiro, chia o carro, toca o sino e a boiada geme...

Cascudo, Luís da Câmara. Lendas Brasileiras para Jovens. São Paulo: Global Editora, 2006

sábado, 29 de março de 2008

LENDAS DO BRASIL - CENTRO-OESTE


Romãozinho


Filho de negro trabalhador, Romãozinho nasceu vadio e malcriado.

Tinha todos os dentes, fisionomia fechada, hábitos errantes, nenhuma bondade no coração.

Divertimento era maltratar animais e destruir plantas.

Menino absolutamente perverso.

Um meio-dia, a mãe mandou-o levar o almoço para o pai que trabalhava num roçado, distante da casa.

Romãozinho foi de má vontade.

No caminho, parou, abriu a cesta, comeu a galinha inteira, juntou os ossos, recolocou-os na toalhinha, e foi entregar ao pai.

Quando o velho deparou ossos en vez de comida, perguntou que brincadeira sem graça era aquela.

Romãozinho entendeu vingar-se da mãe, que ficara fiando algodão no alpendre da casinha:´

- É o que me deram... Minha mãe comeu a galinha com um homem que aparece lá em casa quando o senhor não está pos perto. Pegaram os ossos e disseram que trouxesse. Eu trouxe. É isso aí...

O negro meteu a enxada na terra, largou o serviço e veio correndo. Encontrou a mulher fiando, curvada, abservida na tarefa.

Dando crédito ao que lhe dissera o filho, puxou a faca e matou-a.

Morrendo, a velha amaldiçoou o filho que estava rindo:

- Não morrerás nunca. Não conhecerás o céu, nem o inferno, nem o descanso enquanto o mundo for mundo...

O marido morreu de arrependimento. Romãozinho desapareceu rindo ainda.

Faz muito tempo que este caso sucedeu em Goiás.

O moleque ainda está vivo e do mesmo tamanho;anda por todas as estradas, fazendo o que não presta; quebra telhas a pedradas, espanta animais, assombra gente, tira galinha do choco, desnorteia quem viaja, espalhando um medo sem forma e sem nome; é pequeno, preto, risão, sem ter fé nem juízo.

Homens sérios têm visto Romãozinho.

Furtou uma moça na Chapada dos Veadeiros; conversou com o coletor de Cavalcanti; virou fogo azul indo-e-vindo na estrada, perto de Porto Nacional.

Não morrerá nunca enquanto uma pessoa humana existir no mundo.

E, como levantou falso contra a própria mãe, nem mesmo no inferno haverá um lugar para ele...



Cascudo, Luís da Câmara. Lendas Brasileiras para Jovens. São Paulo: Global Editora, 2006

sexta-feira, 28 de março de 2008

LENDAS DO BRASIL - NORTE







Sapucaia-Roca



Sapucaia-Roca é uma pequena povoação à margem do rio Madeira.

Pouco debaixo do lugar em que se acha assentada, referem os índios que existiu outrora uma outra povoação, muito menor do que essa, e que um dia desapareceu da superfície da terra, sepultando-se na profundidades do rio.

É que os muras, que então a habitavam, levavam a vida desordenada e má, e nas festas, que em honra de Tupana delebravam, entregavam-se a danças tão lascivas e cantavam cantigas tão impuras, que faziam chorar de dor aos angaturamas, que eram os espíritos proterores, que por eles velavam.

Por vezes os velhos e inspirados pajés, sabedores dos segredos de Tupana, haviam-nos advertido de que tremendo castigo aos ameaçava, se não rompessem com a prática de tão criminosas abominações.

Mas cegos e surdos, os muras não os viam, nem os ouviam. E pois um dia, em meio das festas e das danças e quando mais quente fervia a orgia, tremeu de súbito a terra e na voragem das águas, que se erguiam, desapareceu a povoação.

As altas barrancas que ainda hoje ali se veem atestam a profundidade do abismo em que foi arrojada a povoação.

Depois, muitos anos depois, foi que começou a surgir a atual povoação, que ainda não pôde atingir o grau de esplendor da que fora submergida.

Foram de novo habitá-la os muras; mas em breve, por entre a escuridão da noite começaram a ouvir, trabsidos de medo, como o cantar sonoro de galos, que incessante se erguia do fundo das águas.

Consultados os pajés, que perscrutavam os segredos do destino, declararam estes que aquele cantar de galos, ouvidos em horas mortas da noite, provinha daqueles mesmos angaturanas, que deploraram outrora a sorte da povoação submergida e que, sempre protetores dos filhos dos muras, serviam-se do canto despertador dos galos da sapucaia-roca submersa, para recordarem o tremendo castigo por que passaram seus maiores e desviarem a nova geração do perigo de sorte igual.

É este o fato que deu origem ao nome da povoação: Sapucaia-Roca.



Cascudo, Luís da Câmara. Lendas Brasileiras para Jovens. São Paulo: Global Editora, 2006





quarta-feira, 26 de março de 2008

ADIVINHAS

As adivinhas ou adivinhações são desafios em forma que perguntas. Quem nunca ouviu "o que é, o que:" e não se surpreendeu com as questões aparentemente sem pé nem cabeça e com suas respostas interessantes?

Veja algumas retiradas do livro Bazar do Folclore de Ricardo Azevedo:

I
O que é, o que é:
É perigosa de armar
Sempre é melhor não entrar
Ninguém gosta de perder
Todo mundo quer ganhar?
II
O que é, o que é:
Que coisa, que coisa é
Passa a vida na janela
E mesmo dentro de casa
Está fora dela?
III
O que é, o que é:
Costuma chegar na hora
Às vezes vem de repente
Quando vive dá trabalho
Só morta fica contente?
IV
O que é, o que é:
É água e não vem do mar
Nem na terra não nasceu
Do céu ela não caiu
Todo mundo já lambeu?
V
O que é, o que é:
São luzes mas não têm fio
São quietas e agitadas
Se dormem durante o dia
A noite passam acordadas?

Respostas: briga, botão, fome, lágrima, estrelas

Azevedo, Ricardo. Bazar do Folclore. São Paulo: Ática, 2001

domingo, 23 de março de 2008

O MACACO E A VELHA

Era uma casa em cima do morro. A velha morava lá. Na frente tinha jardim e atrás um montão de bananeira. Perto da porta da cozinha ficava uma escada de pegar banana. A escada quebrou. As bananas estavam madurinhas.
Um macaco vinha passando e a mulher o chamou:
- Me ajuda a catar?
O macaco disse sim. Trepou pelas folhas, deu um suspiro e desabou a comer tudo quanto foi banana bem bonita.
A velha gritou:
- Safado!
O macaco ria.
- Pilantra!
A mulher ralhava. O macaco só jogava pra velha banana verde ou então fedida, cheia de mosca e mancha preta. Depois o macaco deu até logo e foi embora.
A velha juntou a banana que sobrou, xingando e caraminholando.
Mandou fazer uma boneca grudenta de cera. Botou na porta de casa, junto de uma cesta cheia de banana. E ficou agachada espiando.
Passou um dia. Nada.
Passou outro dia.
No terceiro, o macaco passou e sentiu um cheirinho bom. Veio chegando:
- Ô Catarina! Quero banana...
A boneca nem se mexeu. No céu, um sol de rachar.
O macaco pediu outra vez. A boneca quieta. O macaco falou grosso:
- Me dá uma banana, ô Catarina, senão leva um tapa.
A boneca nada e ele - pá - deu e ficou com a mão colada no beiço da moça de cera.
- Larga minha mão senão leva um beliscão!
A boneca nem ligou. O macaco deu e ficou com a outra mãos presa.
- Me solta, ô Catarina! Me solta senão toma um chute!
Esperou que esperou. Meteu o pé e ficou mais grudado ainda.
- Diaba! Moleca! Me larga, ô Catarina! - berrou o macaco preparando outro pé.
Chegou a velha arregaçando os dentes:
- Agora você me paga!
Levou o macaco lá dentro e mandou a cozinheira preparar o coitado pra comer na janta.
A empregada foi e fez.
Na hora de matar, o macaco revirou os olhos e cantou:
Me mata devagar
Que dói, dói, dói
Eu também tenho filhos
Que dói, dói, dói
Na hora de esfolar, o macaco cantou:
Me esfola devagar
Que dói, dói, dói
Eu também tenho filhos
Que dói, dói, dói

Na hora de temperar, o macaco cantou:
Me tempera devagar
Que dói, dói, dói
Eu também tenho filhos
Que dói, dói, dói

Na hora de assar, o macaco cantou:

Me assa devagar

Que dói, dói, dói

Eu também tenho filhos

Que dói, dói, dói

A cozinheira serviu o macaco num prato enfeitado com arroz, feijão-preto, couve, farofa e mandioca frita.

A velha estalou a língua, sorriu, cortou um pedaço e mordeu.

Na hora de mastigar, o macaco cantou:

Mastiga devagar
Que dói, dói, dói
Eu também tenho filhos
Que dói, dói, dói

A velha estranhou, apertou os olhos mas comeu tudinho. Foi quando deu uma dor de barriga daquelas, pior que rebuliço nas tripas. A mulher levantou, sentou, andou prá lá e prá cá. Não teve jeito, era o macaco pedindo:

- Quero sair.

A velha respondeu:

- Sai pelas orelhas.

- Não posso não, que tem cera - gritou o macaco - Quero sair!

A barriga da mulher doía.

- Sai pelo nariz.

- Tá assim de gosma. Quero sair!

A barriga roncava cada vez mais.

- Sai pela boca.

- Pela boca tem cuspe. Quero sair!

Aí a velha estufou, estufou e pum!

Foi um estouro que se ouviu lá de longe.

E de dentro dela saiu o macaco e mais um bando de macaquinhos, tudo viola, dançando e cantando:

Eu vi a bunda da velha ,

Eu vi a bunda da velha ,

Azevedo, Ricardo. Histórias que o povo conta. São Paulo: Editora Ática, 2002. p. 26-30

sábado, 22 de março de 2008

COISAS QUE NINGUÉM VÊ

Jamais ninguém vê
Um verão sem poeira
Um ano sem dezembro
Semana sem quinta-feira
Um dia faltar cana
Na zona canavieira

Jamais ninguém vê
Edifício sem altura
Firmamento sem estrela
E oceano sem fundura
E vê uma geração
Sem ter outra futura

Jamais ninguém vê
Desesperro sem aperreio
Quero ver uma capital
Com bonito sem ter feio
E ver uma carta sem selo
Seguir pelo Correio

Porém eu queria ver
Ladrão pra não roubar
Ser humano sem defeito
E sábio pra não errar
E vivendo nesse mundo
Nascer e não se acabar

Jamais ninguém vê
Uma coisa sem autor
Nem vê um ser humano
Que não seja pecador
E dizer que já viu
Um urubu cantador

Quero ver contabilista
Que não saiba contar
Quero ver um rico dizer
Que nunca sentiu uma dor
E quero ver um jurado
Sem juíz e sem promotor

Jamais ninguém vê
Vitória sem derrota
Um árvore envergada
Para ela não ser torta
E coisa muito antiga
Para não ser remota


José Severino Cristóvão

UM JOGO


- Que porta é esta?

- É a do fim do mundo.

- E quem está no começo?

- Um gigante sem queixo.

- Quem está no meio?

- A mulher do espelho.

- Quem chegou agora?

- Quem estava fora.

- Quem vem do lado esquerdo?

- Não posso contar que é segredo.

- Quem está atrás da neblina?

- É uma coisa que não cabe nesta rima.

- Que carruagem é aquela?

- É a da Bela e a Fera.

- Que fumaça é essa?

- É da tua pressa.

- Como se volta do fim do mundo?

- Pelo buraco fundo.

- E se o buraco não chegar?

- Tenho cavalo alado pra te buscar!


Bocheco, Eloí Elisabete. Batata cozida, mingau de cará. Brasília: Ministério da Educação, 2006. p. 31






sexta-feira, 21 de março de 2008

CORDEL


O Sertão e o sertanejo


Os primeiros sertanejos
Viveram no sofrimento
Quando não existia carro
Que o transporte era jumento
E hoje o sertão chora
Com o seu desmatamento


Com o seu desmatamento
Pois veio desaparecer
As belezas do sertão
Que a gente podia ver
As vezes acontece assim
Anos e anos sem chover


Quando fica sem chover
O lavrador se retira
O pequeno fazendeiro
Apertado ele se vira
Alimentando seu gado
Com faxeiro e macambira


Na terra da macambriea
O desgosto lá se pôs
Nas estradas a gente vê
Os velhos carros de boi
O presente vem na frente
E o passado vem depois


Do velho carro de boi
Eu tenho saudação
Foi o primeiro transporte
Da remota geração
E foi o primeiro carro
Que rodou no meu Sertão


Do sertanejo e do sertão
A saudade é demais
Já na terra de vovô
E da infância de meus pais
Terra de homem honesto
Que não tinha marginais


José Severino Cristóvão

BEM SE PAGA COM O BEM

A onça caiu numa armadilha preparada pelos caçadores e, por mais que tentasse escapar, ficou prisioneira. Resignara-se a morrer, quando viu passar um homem. Camou-o e lhe pediu que a libertasse.


- Deus me livre! - disse o transeunte. - Se você ficar solta, vai me devorar.


A onça jurou que seria etrnamente agradecida, e o homem desatou as cordas que seguravam a tampa do alçapão e ajudou a onça a deixar a cova. Logo que esta se encontrou livre, agarrou seu salvador por um braço dizendo:


- Agora você é meu jantar.


Debalde o homem pediu e rogou. A onça, finalmente, decidiu:


- Vamos combinar uma coisa. Ouvirei a sentença de três animais. Se a maioria for favorável ao meu desejo, eu o como.


O homem aceitou e saíram os dois. Encontraram um cavalo, velho, doente, abandonado. A onça narrou o caso. O cavalo disse:


- Quando eu era moço e forte, trabalhei e ajudei o homem a enriquecer. Qual foi o meu pagamento? Largaram-se aqui para morrer, sem um auxílio. O bem só se paga com o mal.


Adiante depararam-se com um boi. Consultado, opinoupela razão da onça. Contou sua vida de serviços ao homem e, quando julgava que ia ser recompensado, soube que fora vendido para ser morto e retalhado pelo açougueiro. O bem só se paga com o mal.


O homem, triste, acompanhava a onça que lambia o beiço, quando viram o macaco. Chamaram o macacoe pediram seu parecer. O macaco começou a rir. E saltava, fazendo caretas e rindo. A onça ia-se zangando:


- Por que tanta risada, camarada macaco?


- Não é fazendo pouco - explicou o macaco -, é que eu não acredito que o homem caísse na armadilha que ele mesmo preparou.


- Ele não caiu. Quem caiu fui eu - contava a onça.


- Foi você? Então como é que esse homem fraquinho pôde libertar um bicho tão grande e forte como a camarada onça?


A onça, despeitada pelo macaco julgá-la mentirosa, foi até o alçapão e saltou para o fundo do fosso, gritando lá de baixo:


- Está vendo? Foi assim!


Mais que depressa o macaco empurrou o engradado de varas pesadas que fazia de tampa e a onça tornou a ficar prisioneira.


- Camarada onça - sentenciou o macaco - o bem só se paga com o bem. E você fez o mal, receba o mal.


E se foi embora com o homem, deixando a onça na armadilha.
CASCUDO, Luís da Câmara. Contos Tradicionais do Brasil. São Paulo: Global Editora, 2003. p. 12 - 16


quarta-feira, 19 de março de 2008

O TOURO E O HOMEM

Um touro, que vivia nas montanhas, nunca tinha visto o homem. Mas sempre ouvia dizer por todos os animais que ele era o animal mais valente do mundo. Tanto ouviu dizer isto que, um dia, se resolveu a ir procurar o homem para saber se tal dito era verdadeiro.
Saiu das brenhas e, ganhando uma estrada, seguiu por ela. Adiante encontrou um velho que caminhava apoiado a um bastão.
Dirigindo-se a ele perguntou:
- Você é o bicho homem?
- Não - repondeu o velho. - Já fui, mas não sou mais!
O touro seguiu adiante encontrou uma velha:
- Você é o bicho homem?
- Não sou a mãe do bicho homem!
Adiante encontrou um menino:
- Você é o bicho homem?
- Não! Ainda hei de ser, sou o filho do bicho homem.
Adiante encontrou o bicho homem que vinha com um bacamarte no ombro.
- Você é o bicho homem?
- Está falando com ele!
- Estou cansado de ouvir dizer que o bicho homem é o mais valente do mundo, e vim procurá-lo para saber se é mais valente do que eu!
-Então, vá lá! - disse o homem, armando o bacamarte, e disparando-lhe um tiro nas ventas.
O touro, desesperado de dor, meteu-se no mato e correu até sua casa, onde passou muito tempo se tratando do ferimento.
Depois, estando ele numa reunião de animais, um lhe perguntou:
- Então, camarada touro, encontrou o bicho homem?
- Ah! Meu amigo, só com um espirro que ele me deu na cara, olhe em que estado fiquei.
CASCUDO, Luís da Câmara. Contos Tradicionais do Brasil. São Paulo: Global Editora, 2003. p. 8 - 10

DAR UMA COLHER DE CHÁ

Dar uma colher de chá é perdoar, dar uma chace, dar uma oportunidade para algém tentar de novo, corrigir o erro que cometeu, fazer uma tentativa.

A gente ganhou o jogo por dois a zero. O jogo acabou, mas a gente vai dar uma colher de chá: mais cinco minutos pra ver se vocês conseguem pelo menos marcar um golzinho.

- Por favor, professora, dá uma colher de chá! Não dá zero não!

O CEGO E O DINHEIRO ENTERRADO

Um cego muito econômico guardava suas moedas em casa e, temendo os ladrões, resolveu esconder seu tesouro no quintal. Cavou um buraco ao pé de uma árvore, debaixo da raiz, e deixou seu denheiro bam disfarçado.

Sucedeu que um seu visinho, vendo-o ir tão cedo para o fundo do quintal, acompanhou-o, descobrindo o segredo. Qaundo anoiteceu, voltou à árvore e furtou todo o dinheiron que o cego enterrara.

Pela manhã, o dono veio, tateando, verificou ter sido roubado. Como não resolvia chorar ou queixar-se, fingiu não ter sido visitado pelo ladrão e começou a pensar em uma forma de readquirir seu dinheiro sem barulhos.

Foi procurar o vizinho e lhe falou, por aqui assim: - "Vizinho, nesse tempo ninguém pode terconfiança senão em si mesmo, apesar dos dentes morderem a língua e ambos viverem juntos. Juntei minhas economias e escondi num pé de árvore ali no meu quintal, pensando ser lugar bem seguro. Acabo de receber um dinheiro que emprestara e vim pedir conselho a você. Guardo tudo junto ou levo esse dinheiro para a cidade?"

O vizinho pensou logo e pegar todo o dinheiro do cego e aconselhou-o que deixasse tudo, no mesmo canto já antigo. E Logo que escureceu, correu e foi levar o que tirara na noite anterior, para o cego não desconfiar. Cobriu tudo de areia, alisou e retirou-se. Mais tarde, o cego procurou o cantinho velho e tomou posse do seu dinheiro ali restituído pelo vizinho que sonhava ficar com tudo.

E, quando o ladrão voltou, encontrou apenas o buraco oco, sem um níquel sequer.

CASCUDO, Luis da Camara. Literatura oral no Brasil. Belo Horizonte: Itariaia, 1984. p.303